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Críticas de segunda e Opiniões de quinta sobre Quadrinhos

Por Thiago de Oliveira

Os melhores quadrinhos de 2022

Os melhores quadrinhos de 2022

Está na hora de saber quais são os melhores quadrinhos de 2022. Conheça o top 10 da nossa pilha de leitura.

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Fazer listas talvez seja uma das formas mais antigas de se catalogar algo e também uma das mais interessantes. O ato de ir se colocando este ou aquele item numa folha de papel ou no meu caso numa planilha no Notion, confere a ele uma importância e também, no meu caso, uma noção de passagem de tempo. Consigo ir ali e em dois cliques perceber os meses onde ataquei com mais afinco a pilha de leitura e aqueles onde as atribulações da vida me afastaram das HQs. Contudo, voltar a essa lista e escolher quais foram os melhores quadrinhos de 2022 é sempre um trabalho complicado. 

Porém, cá estou. Reavaliando as leituras com um bocado de atenção, uma dose de autocrítica e constatar que pelo menos três pontos das resoluções da virada 2021-2022 foram atingidos. Consegui aumentar a quantidade de autores brasileiros, estou dois títulos mais próximo de ter tudo do Alan Moore e fechei a coleção de Corto Maltese publicada pela editora Pixel e comecei a da editora Trem Fantasma.

A primeira resolução foi, muito em parte, alcançada graças ao FIQ, que pode enfim voltar a ser realizado como relatado na retrospectiva quadrinística de 2022. Quanto ao prometido Kindle, não foi dessa vez e acredito que ficará para um outro momento. No entanto, as HQs digitais continuam firmes e fortes e em especial a leitura pelo Instagram, ainda mais com o surgimento da Borduna Produções, de quem irei falar mais adiante.

O ano que se passou também foi interessante no quesito colecionismo, já que pude realizar o sonho de ter um escritório para acomodar e expor, de forma ordenada, meus livros e quadrinhos. Desta forma, o Alan Moore acabou ganhando quase uma seção inteira na estante, seguido pelo Grant Morrison e os quadrinhos da Vertigo. De tal forma que a coleção reflete a minha era de ouro dos quadrinhos, apesar dela ter ocorrido nos meus 16-17 anos, ao contrário do que disse o Érico Assis em seu cânone dos quadrinhos.

Mas olha aí, cá estou eu divagando mais uma vez. Vamos deixar o papo sobre colecionismo para um outro momento e avancemos para a lista de melhores quadrinhos (lidos) de 2022. E já posso adiantar que 2022 foi o ano dos quadrinhos brasileiros (obrigado FIQ)! 

10 – Eu matei Adolf Hitler

Eu matei Adolf Hitler capa
Capa de: Jason

O ano que passou foi de várias descobertas e primeiros encontros. Um deles foi com o quadrinista norueguês Jason. As críticas e entrevistas que li sobre o autor e seus quadrinhos ao longo dos anos, mais o seu traço antropomórfico e minimalista sempre o fizeram estar no meu radar. Então, aproveitando o Mino day escolhi um de seus títulos e admito que optei por este em particular devido ao mote e por me lembrar do filme Ele Está de Volta.

Muito que tinha para dizer sobre a história disse aqui, mas gostaria de reiterar que a sequência inicial da HQ é uma das mais espetaculares. Em duas páginas, Jason nos joga em um mundo cruelmente apático no qual pessoas são indiferentes a tudo que não elas mesmas. Duas páginas e temos as regras desse universo, os dilemas dos protagonistas e uma sensação amarga na boca.

9 – Corto Maltese: sob o sol da meia-noite

Outro bom reencontro que 2022 me proporcionou foi com o garboso marinheiro criado por Hugo Pratt. Em uma bonita edição e com excelentes paratextos, a editora Trem Fantasma inicia a sua coleção com o pé direito.

Capa de: Rubén Pellejero

Trazendo a primeira aventura da trilogia assinada por Juan Díaz Canales (Blacksad) e Rubén Pellejero (Dieter Lumpen, Cromáticas); o volume inicial da coleção nos coloca junto a Corto percorrendo diferentes partes das Américas central e do norte. Panamá, a Exposição Universal de 1915 em São Francisco e por fim as vastas planícies geladas do Alasca e do Canadá. Tudo para cumprir uma promessa a um velho amigo: o escritor Jack London.

A arte de Pellejero é precisa ao emular poses e enquadramentos de Pratt, assim como o dinamismo do quadrinista italiano. Ao mesmo tempo, a suave paleta de cores utilizada pelo desenhista traz um tom de ineditismo. Quanto ao texto de Canales, o roteirista faz um excelente trabalho mantendo todos os tons de cinza que encontrávamos nas antigas aventuras de Corto Maltese.

Navegando em um estreito entre a homenagem e a originalidade, Canales e Pellejero se saíram muito bem, marinheiros experientes que são. E o resultado foi primoroso e ao final da leitura a sensação foi a de rever um velho amigo.

8 – Promethea vol. 2

Capa de: J.H. Williams III

Muito já foi dito sobre a Promethea do Moore, então me alongar aqui é chover no molhado. Porém, para além da longa meditação sobre magia e realidade que o bruxo de Northampton faz, é possível também encontrar uma bonita mensagem solar sobre esperança e coragem. Mesmo quando o apocalipse se apresenta no horizonte. 

Ok, ok, eu sei que o que disse pode parecer piegas, mas posso dizer que no ano que passou, precisávamos (ou pelo menos eu precisei rsrsrs) de  mensagens como essa. 

Mesmo que às vezes o hermetismo da simbologia e do texto pareçam querer engolir quem lê a história de Sophie Bang, dê uma chance.

7 – Risca Faca

Risca faca capa
Capa de: André Kitagawa

Um dos vários presentes do FIQ que pontuam está lista e sobre o qual já falei aqui, Risca Faca de André Kitagawa foi um dos indicados ao prêmio Jabuti de 2022. Indicação essa que coroa o retorno do paulista ao universo dos quadrinhos. 

Reunindo três histórias ambientadas nas ruas de São Paulo ou de um planeta imaginário, como disse o autor, a HQ nos coloca de frente com personagens que doem e que cativam. Personagens que se movem a margem, invisíveis, violentos e violentados.

Tecendo uma colcha de retalhos, Kitagawa une as histórias de três pessoas nos detalhes cruéis daqueles locais limiares que toda cidade tem, mas que desviamos o olhar. 

Marcada por momentos absurdos, mas totalmente críveis, a HQ é cruel, mas também um esmero de técnica na arte e no texto.

6 – O Colecionador

capa de: Sergio Toppi

Outra HQ que também apareceu no blog em 2022, O Colecionador de Sergio Toppi foi uma grata surpresa. Recomendação de Sidney Gusman e lançada pela editora Figura, a história narra um misterioso milionário percorrendo o mundo coletando estranhos objetos. Relíquias mágicas de diferentes partes do mundo, representantes de momentos únicos e inigualáveis.

Meu primeiro contato com Toppi não poderia ter sido melhor. Uma história envolvente, que me lembrou a escrita do também italiano Hugo Pratt, e uma arte arrebatadora. 

Trabalhando com enquadramentos e alternando entre closes teatrais e grandiosos planos abertos, Toppi vai criando uma narrativa complexa e, às vezes, onírica. Onde o que importa não são os objetos coletados, mas sim o sentimento que o colecionador lhe dá. 

5 – Top 10

2022 também foi o ano de dar seguimento no projeto de leitura das obras do Alan Moore e dentre as escolhidas (e que o dinheiro também permitiu) estava Top 10. Um misto de série policial e super-heróis onde, mais uma vez, o escritor inglês mostra os motivos para ser lembrado como um dos maiores roteiristas da nona arte.

Capa de: Gene Ha

Contando as histórias dos policiais do distrito 10 de Neópolis, está maxissérie pode ser vista como a solução do escritor para os clichês das histórias de equipe de supers. Utilizando da estrutura das séries televisivas de policiais, o roteirista avança para uma história onde todos os personagens são super-heróis, deuses, robôs, magos e monstros. 

Com efeito, o que temos é uma HQ onde Moore eleva a sua ideia de como uma extensa quantidade de informações pode ser incluída em cada quadro. E acredite quando digo extensa. A maioria das páginas, se não todas, são carregadas de easter eggs que ora funcionam como recompensas, ora como formas de desacelerar a leitura. Porém, todos esses easter eggs também ajudam a criar mais densidade à paisagem urbana enriquecendo o universo criado pelo roteirista e seus companheiros de trabalho.

4 – Oleg

Falando em bons contadores de histórias, saímos das frias terras inglesas e vamos para as montanhosas terras suíças, de encontro ao quadrinista Frederik Peeters (e enquanto escrevo percebo que ele também apareceu na lista de 2021). 

E se em Pílulas Azuis, vimos Peeters descortinar a si e a sua vida, aqui em Oleg surge seu alter ego. É Peeters, mas também é algo a mais. 

Capa de: Frederik Peeters

Oleg é um quadrinista que está passando por um bloqueio criativo e, assim como todos os que sofrem deste mal, ele também busca por um bálsamo. E tal qual muitos artistas, Oleg encontra alívio ao falar de si. O próprio título já faz essa brincadeira: mude umas letras de lugar e encontramos a palavra Lego, mude de novo e topamos com “l’ego”, o ego.

Daí termos uma história sobre o cotidiano do autor, sobre o ato de acordar e dormir, sobre um festival de quadrinhos, sobre uma palestra para crianças, sobre a relação de pai e filha, sobre o medo de perder quem se ama. E também é claro sobre o seu ateliê e o labor quadrinistico de sentar e ficar sobre a prancheta. E mais, muito mais. 

Tudo isso vem embalado com um texto tocante, uma arte maravilhosa e uma história sobre um quadrinista, sua vida e tudo aquilo que nos faz humanos.

3 – Jeremias: alma

Talvez o selo Graphic MSP seja uma das mais importantes contribuições da última década ao mercado de quadrinhos brasileiros. Apresentando toda uma nova leva de quadrinistas ao grande público e reinventando os personagens clássicos da Maurício de Sousa Produções, o selo vem constituindo importantes marcos na nona arte nacional. Sendo possível dizer que Jeremias: Pele é um deles. O que fez certamente com que a expectativa por esta continuação fosse bem alta.

Capa de: Jefferson Costa

Em resumo, é possível dizer que Rafael Calça (roteiro) e Jefferson Costa (arte) acertaram mais uma vez. E acertaram com gosto e na mosca, não à toa receberam uma segunda indicação ao prêmio Jabuti, em 2021, por essa belíssima sequência. 

Se em Pele, os autores falaram sobre o tornar-se negro no Brasil, em Alma eles vão tratar da busca pela nossa ancestralidade. Afinal, uma das perguntas fundamentais é: “de onde eu vim” e se tratando de Brasil e o apagamento de sua história negra, o questionamento é ainda mais importante. E a resposta dada pelos autores é de encher os olhos. 

Fiquem atentos, pois ainda vai rolar uma crítica sobre a HQ no blog, porque ela merece e muito um texto só dela.

2 – Carniça e a Blindagem Mística vol. 1 e vol. 2

Capa de: Shiko

Outro presente do FIQ de 2022. Finalmente consegui por as minhas mãos nos dois primeiros volumes deste faroeste/terror/conto de vingança do queridíssimo Shiko. E que vem ganhando pouco a pouco um cantinho na coleção.

Para quem conhece o trabalho do artista paraibano, é de se esperar uma boa dose de brutalidade misturada a um tanto de misticismo e aqui não é diferente. Juntando pesquisa histórica e ficção, Shiko narra a história de um bando de cangaceiras percorrendo o sertão a fim de vingança. Isso com uma forte crítica social, protagonismo feminino e violência, tudo aliado a uma aquarela finíssima. 

Com efeito, temos um universo onírico, lindo e atroz, com cenas, closes e cores belíssimas. E duvido que você encontre uma representação tão única da Morte como a que Shiko criou.

1 – A menor distância entre dois pontos é uma fuga

Acredito que ainda não tenha dito por aqui os motivos de preferir uma HQ impressa para as suas irmãs mais modernas e digitais. A explicação rápida é de que algumas coisas só podem ser feitas no papel e com o passar das páginas. O ato de folhear, as viradas de página, o layout dos quadros e o próprio projeto gráfico da HQ interferem nas sensações que temos ao ler a história. 

Capa de: João Belo

E a HQ de Gabriel Nascimento e João Belo é um belo exemplo do que somente o papel pode proporcionar. Isso sem contar que “A menor distância entre dois pontos é uma fuga” é, também, uma amostra do poder que os quadrinhos têm. Utilizando boa parte dos elementos que só podem ser encontrados nessa mídia, os autores criaram um roteiro pensado na produção gráfica. 

Contando três histórias que se entrelaçam, a HQ narra a história de um jovem pracinha na 2ª Guerra Mundial, a de uma mulher numa pequena cidade interiorana em sua dupla jornada de trabalho e a de um homem em um hospital psiquiátrico que busca se encontrar. 

Quando forem ler, prestem atenção aos detalhes. O uso dos resquadros, do respiro, as viradas, a diagramação, os cadernos de impressão e o uso das cores. Tudo é pensado para se criar uma experiência única e para contar uma tocante história sobre transfobia, racismo e coragem. Tanto que, a indicação ao Prêmio Jabuti de 2022 de História em quadrinhos foi mais que merecido. 

Menções honrosas

Ufa, passamos o nosso top 10 de melhores quadrinhos de 2022. Se bem que há sempre aquelas histórias ou iniciativas que, mesmo não entrando na lista, fica complicado de não citá-las. 

Começo com o pessoal da Borduna Produções, que me fez fixar de vez o Instagram como principal ponto para a leitura de tiras. Criado pelo trio Rafa Campos Rocha, João Pinheiro e Álvaro Maia, é possível dizer que a Borduna é um coletivo digital de quadrinistas. Um local onde se pode ir todos os dias da semana e acompanhar uma das 10 HQs publicadas no perfil. De domingo a domingo uma ou duas tirinhas são publicadas. E posso dizer que as histórias são o crème de la crème e tem para todos os gostos.

Outro perfil no Instagram que recomendo é da quadrinista Helena Cunhas. Ela vem publicando o seu novo quadrinho por lá: Normal. Que conta a história de Clarinha que “cansada de esperar pela cura gay que a igreja tanto promete, Clarinha resolve fazer um pacto com o diabo”. Simplesmente sensacional.

Em relação aos lançamentos do selo Graphic MSP de 2022, Franjinha: contato de Vitor Cafaggi foi o ponto alto. Com uma história sobre como é complicado crescer, Cafaggi coloca o querido inventor do bairro do Limoeiro numa jornada para além dos universos conhecidos. 

Dois livros também pontuaram a entrar na lista e são: 

  • Pancadaria: por dentro do épico conflito Marvel vs DC, de Tucker Reed
  • Uma pequena história dos quadrinhos para uso das novas gerações, de  Rogério de Campos

O primeiro conta a história da Marvel e da DC e a relação das duas maiores editoras dos EUA. Um misto de rivalidade, coleguismo e muitas trocas de cadeiras em comum. Além disso, o livro busca demonstrar os motivos pelos quais a Casa das Ideias estar hoje na frente de sua distinta concorrente.

Já o segundo livro, escrito pelo editor da Veneta, é uma viagem lisérgica sobre as origens e movimentos da nona arte, mostrando que talvez tudo esteja conectado. 

Agora se você perdeu alguma coisa ou quer relembrar algo do ano que passou, dê uma lida 

E se você perdeu alguma coisa dê uma lida na nossa pequena, subjetiva e incompleta retrospectiva de 2022 aqui.

E para 2023?

Sebos. Definitivamente aumentar a minha ida aos sebos. Garimpar bastante para continuar as minhas leituras enquanto me movo para completar as lacunas da coleção. 

Digo isso, pois continuo me mantendo fiel aos critérios da minha coleção de quadrinhos e só mantendo o essencial. E também para se fazer uma distinção entre o leitor de quadrinhos e o colecionador que habita em mim. Uma diferença que anda fazendo falta por aí em alguns comentários sobre o mercado brasileiro de quadrinhos. Pois, lembre-se que você não precisa ter tudo e que às vezes uma ida à biblioteca ou ao sebo pode ser mais benéfica do que a indicação daquele gibi imperdível que acabou de sair. 

Foco pessoal, foco. 

Mas e para vocês, quais foram os melhores quadrinhos de 2022?

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