Ficha técnica
Star Wars Legends: Made in UK
Autores: Alan Moore (roteiro), Steve Moore (roteiro), Steve Parkhouse (roteiro), Adolfo Buylla (arte), Alan Davis (arte), John Stokes (arte), James Sinclair (cores), Laura Allred (cores), Matt Webb (cores), Pamela Rambo (cores),
Tradutor: Mateus Alencar
Letrista: Fábio Figueiredo
Preço: R$ 46,90
Editora: Panini / Marvel UK
Publicação: Abril/2022
Número de páginas: 88
Formato: 17 x 26 cm / Colorido/Capa dura
Gênero: Space Opera
Sinopse: Star Wars, a space opera definitiva, encontra alguns dos maiores talentos ingleses. Alan Moore e outros grandes autores contam eventos de uma galáxia muito, muito distante.
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A Marvel UK e Star Wars
Não é de hoje que a Marvel publica as aventuras de Luke, Leia, Han e Vader. Para ser mais exato, a editora norte-americana já possuía um contrato desde 1977, quando o primeiro filme do universo criado por George Lucas foi lançado. Uma parceria que seria interrompida em 1986 e retomada em 2015, após a compra da Lucasfilm pela Disney.
Contudo, em 1979, a Marvel UK, divisão inglesa da Casa das Ideias, se viu em um imbróglio com o cancelamento da revista Pizzazz, que foi responsável por publicar as primeiras histórias originais de Star Wars que não eram adaptações dos filmes. Com o fim da revista, algumas histórias ficaram a ver navios e vão encontrar um novo lar em Star Wars Weekly. Publicação que, posteriormente, a partir do número #118, mudará de nome e passará a se chamar The Empire Strikes Back Monthly e depois Star Wars Monthly.
Star Wars Weekly é uma publicação importante, pois é nela que irão surgir os primeiros escritos criados por autores ingleses. E são estas histórias que Star Wars Legends: Made In Uk reúne e que, finalmente, aterrissaram por aqui através da Panini.
Antes de prosseguirmos é indispensável informar que o selo Legends inclui todas as histórias não canônicas do universo Star Wars. Mudança ocorrida em 2014 após um anúncio da Lucasfilm em preparação para a nova trilogia lançada entre 2015-2019. Desta forma, todas as histórias presentes no volume não fazem parte do cânone atual do universo de Star Wars. Contudo, para nos situarmos, é necessário dizer que elas se passam entre o fim de “Uma nova esperança” e o início de “O império contra-ataca”.
Aviso dado, vamos ao volume.
Star Wars para inglês ver
Muito da força da invasão britânica, nome que se deu ao fenômeno ocorrido no final dos anos 80, quando vários quadrinistas ingleses adentraram no mercado norte-americano, se deve às novas perspectivas e conceitos que os ingleses trouxeram às HQs. Seja reformulando noções ou abordando novos temas, o que se viu foi um alargamento dos argumentos utilizados em histórias de ficção científica, terror e super-heróis. Isso quando não houve uma quebra em determinadas fronteiras.
Analogamente, é possível ver este volume como um microcosmo da época. Um condensado de histórias que mostram os motivos de como quadrinistas, até então, desconhecidos, chegaram com os dois pés na porta no mercado estadunidense. Além, é claro, de servirem como um marcador do que estava ocorrendo na cena britânica de quadrinhos dos anos 80.
Não que todas as histórias do volume sejam excepcionais, mas todas trazem elementos não convencionais ou exploram eventos inéditos no universo criado por George Lucas. O que acaba trazendo um frescor a todas elas. Afinal de contas, não são todos os dias em que vemos Leia, Han e Chewbacca presos por um culto maligno extradimensional, como em Efeito Pandora ou Leia tendo um encontro com seres da quinta dimensão em busca de divertimento como em Tilotny cria forma.
Ambas as histórias acima foram criadas por Alan Moore, que ainda assina outras três, totalizando assim cinco das oito histórias compiladas em Star Wars Legends: Made In Uk. Ficando a cargo de Steve Moore escrever outras duas e Steve Parkhouse sendo autor da última.
Esta predominância do mago de Northampton faz com que a maioria das histórias tenha um cunho mais aterrorizante, enquanto as histórias dos xarás possuem uma pegada mais aventuresca. Parkhouse narra os eventos da criação da Millennium Falcon e o porquê de ser a única entre todas as naves do universo de Star Wars. Steve Moore conta eventos relacionados à guerra entre o Império e os rebeldes, com direito a várias emboscadas.
Alan Moore e Star Wars
Explorando conceitos oriundos do terror cósmico e psicológico, Moore acaba sendo aquele que melhor explora as frestas entre os filmes para acrescentar novos ingredientes a space opera. Histórias como a já citada, Tilotny cria forma – que brinca com estarmos à mercê de forças maiores e incompreensíveis -, ou em Fúria cega – onde Luke Skywalker precisa lutar contra os horrores da Ordem do terrível brilho – demonstram bem como o roteirista sabe trabalhar a liberdade que lhe é dada.
Adicionando deuses, monstros, novos inimigos e personagens, Moore vai deixando a sua marca em Star Wars. Além de podermos ver temas que serão explorados pelo roteirista em outras publicações de ficção científica e que foram compiladas nos álbuns Choques Alienígenas e Choques Futuristas, ambos publicados por aqui pela editora Mythos.
Contudo, é também possível ver as qualidades que levaram Moore a ser reconhecido, ainda nos anos 80, como um dos grandes da nona arte: sua qualidade de síntese narrativa e a criatividade para colocar personagens conhecidos em tramas nada óbvias.
Características essas que podem ser melhor observadas em A consciência do lorde das trevas e A ferrugem nunca dorme. A primeira mostra Darth Vader em uma estranha partida de xadrez que rapidamente se revela como um plano para eliminar o lorde sith. E em seis páginas, o roteirista consegue apresentar um personagem inédito a saga, com suas motivações e criar uma história tensa, que vai crescendo até sua explosiva conclusão. Isso sem contar em como o Vader de Moore é frio e imponente, mesmo não tendo tanto espaço para trabalhar, algo que a arte de John Stokes evidencia com maestria.
Já em A ferrugem nunca dorme, somos levados ao planeta Ronyards onde R2-D2 e C-3PO estão em uma missão diplomática para avisarem os habitantes do planeta sobre os perigos do império. E aqui Moore mescla religião e inteligência artificial, pois teriam os droides um deus a quem possam rezar? E de novo, o que nosso bardo de Northampton faz em seis páginas é assombroso. Introduzindo, mais uma vez, novos personagens e locações em uma história sobre os limites entre religiosidade, tecnologia e consciência coletiva.
Conclusão
Star Wars Legends: Made In Uk é uma daquelas publicações que são como tempo cristalizado, conservando um momento da história ou quase isso. Já que, eventualmente, são histórias que antecedem um momento único da nona arte inglesa-americana, algo que viria a se tornar um ápice onde toda a criatividade de jovens fãs de quadrinhos viria a se tornar uma torrente fecunda de histórias e títulos que iriam mudar o mercado.
Trazendo oito histórias curtas, o volume conta com jovens roteiristas que, trabalhando em séries curtas de seis ou oito páginas, precisavam ser engenhosos para garantir não só os seus trabalhos, mas também a audiência. E com isso moldaram o seu senso narrativo explorando todas as brechas possíveis em grandes conglomerados, hackeando não só suas carreiras, mas também personagens, séries e títulos.
Nota: 3